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De onde vem a coragem de um príncipe?...

Inês Ataíde Gomes

Figura 1 – Representação da Atlântida segundo o pesquisador espanhol Manuel Cuevas
Figura 1 – Representação da Atlântida segundo o pesquisador espanhol Manuel Cuevas

Há muito muito tempo, num reino muito distante, vivia um príncipe que todos admiravam por na sua juventude ser bondoso, atento e inteligente, todos conheciam estas suas características pois tinha por hábito visitar os cantos mais distantes do seu reino e assim dar-se a conhecer ao seu povo, nem todos sabiam que nem sempre era assim, mas era-lhe tão fácil nestas ocasiões sê-lo, tinha aprendido tão bem a mostrar-se seguro e altivo, que o fazia com a maior das naturalidades.

O seu fiel escudeiro, que tinha crescido com ele e que com ele partilhava muitas horas do dia, sabia que às vezes, especialmente quando estava com fome, ou contrariado com as solicitações rebuscadas da rainha mãe, se tornava rabugento e irritadiço, e, por outro lado, que quando estava bem disposto pregava partidas às cozinheiras, e aproveitava a desorientação provocada pelos sustos para levar uns biscoitos, porque os havia sempre na cozinha real, que partilhava depois com alegria com as crianças .

Um dia, ao passear sozinho no bosque que existia para além dos limites da cidade, coisa a que tinha sido proibido desde a mais tenra idade, sofreu uma emboscada e viu-se rodeado de malfeitores. Tremia por dentro como varas verdes o nosso príncipe, naquele momento não teve em si nenhum laivo do homem corajoso que queria ser um dia, mas sabia que tinha de estar à altura do que dele esperavam e inventando uma voz que não a dele dirigiu-se aos rudes homens “Sou o vosso príncipe! Devem-me respeito e obediência! Vão à vossa vida em paz pois o nosso reino é um lugar de harmonia e benevolência!”. Com o coração acelerado e pálido como um lençol observou os homens mais assustados que ele imaginando já uma decapitação a fugirem pelos caminhos e desaparecerem por entre as árvores.

Voltou para casa muito triste nesse dia, tentando não ser visto por ninguém, sentia-se fraco, cobarde e envergonhado.

O Rei, que estava sempre muito atento ao seu filho e herdeiro, nessa mesma noite bateu ao de leve no quarto do filho. O príncipe chorava e na certeza de que o rei o amava permitiu-se ser tão pequenino quanto se sentia e contou todo o episódio ao pai. O sábio rei segredou-lhe ao ouvido “Sei que existe um rei corajoso dentro de ti meu pequeno, dá-lhe tempo de aparecer!”

No dia seguinte ao acordar o príncipe encontrou, poisadas na cadeira aos pés da sua cama, uma espada e uma malha de ferro, admirou-as longamente, experimentou-as longe dos olhares de terceiros, nem reparou quando o rei entrou acompanhado de um dos seus soldados. A partir desse dia o príncipe, munido da sua espada e da sua malha, aprendeu com o bravo soldado toda a arte do manejo da espada, não apenas para lutar, mas para defender o seu reino, impor a lei, honrar o povo, toda uma sabedoria que se foi tornando sua, e o transformou no mais corajoso dos príncipes.

 

Continuando no jogo:

De acordo com a teoria dos papeis de Jaime Rojas-Bermúdez vamos identificar (o número entre parênteses corresponde à figura abaixo):

 

a)      Papeis bem desenvolvidos (3)

b)      Papeis (3)

c)       Papeis pouco desenvolvidos (4)

d)      Pseudo-papel

e)      Contexto para o aparecimento do pseudo-papel (9)

f)       Papeis complementares (5)

g)      Vínculo (7)

h)      Objeto intermediário (8)

i)        Interação e inter-relação de papeis (10) (11)

j)        Situação em que o si mesmo está distendido (12)

k)      Situação em que o si mesmo está contraído (13) 



 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 






NOTA: O limite do si-mesmo, aqui aparentemente apresentado como uma estrutura rígida, não o é. Expande-se (12) e contrai-se (13), como uma membrana viva, consoante o individuo se sente mais ameaçado – em maior tensão e estado de alerta - expandido, ou em menor tensão, seguro e a salvo – mais perto do núcleo do eu – contraído.

 

Este conto ajuda-nos a fazer uma leitura deste esquema:

Como Papéis muito desenvolvidos a) temos o ser bondoso, atento, inteligente, seguro e altivo, os únicos acessíveis quando o limite do si-mesmo se encontra mais expandido, por haver tensão, ou um estado de alarme j), no conto, quando o príncipe sai para as suas voltas longe do castelo.

Como papeis muito naturais que surgem num ambiente mais familiar e descontraído b), em que a tensão é um pouco menor temos rabugento, irritadiço, bem-disposto. A exigência da rainha-mãe, que se vincula g) com o nosso príncipe, é o papel complementar f) que faz surgir o irritadiço e rabugento.

A situação da abordagem dos malfeitores criou o contexto e) para o aparecimento de um pseudo papel d) de corajoso, que à altura não correspondia a um prolongamento do eu.

Quando se retira para o seu quarto e face a um pai bondoso, criam-se as condições de confiança e baixa tensão para ocorrer a contração do si-mesmo k) e assim para o aparecimento de alguns papeis pouco desenvolvidos c), o ser triste, e pequenino.

Percebendo que para se sentir mais corajoso o príncipe precisa de aprender as artes da guerra (papel pouco desenvolvido) o rei oferece-lhe objetos intermediários h), a espada e a malha de ferro, e um papel complementar f), o bravo soldado que o ensina.

Ilustrando a interação e a inter-relação de papeis, termos os papeis de rabugento e irritadiço, ou de cobarde e envergonhado.

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